6.29.2009

Imaginemos que há sitios que funcionam como um palco



foto Greg Williams

outros como uma passerele. Naquela rua vivem banqueiros, há uma modelo linda com pernas até ao céu que passa todos os dias, editoras de moda, actores, presidentes de empresas, vagabundos, estudantes de arte, secretárias, turistas, avozinhas com netos. Melhor dizendo, toda a gente passa naquela rua. Porque qualquer pessoa que more ou visite a cidade há-de, obrigatoriamente, descer ou subir a calçada sem carros, talvez apressadamente ou em passo lento, saboreando as montras ou procurando o anonimato em passadas largas e óculos escuros. O que quer dizer que poderemos também nós sentarmo-nos nos degraus da igreja [como os que cospem fogo e tocam musica em troco de moedas] e esperar pacientemente por alguém que procuramos e não encontramos.
Mais tarde ou mais cedo essa pessoa há-de passar por ali, isso é garantido.
Reparei nela pelos sapatos primeiro. Eram brancos e ponteagudos, de salto alto e conjugados com peugas azuis de riscas amarelas. Também isto não está correcto. Comecei por reparar nos lábios que pareciam esborratados numa figura com alguma dignidade. Só depois é que me virei para os sapatos, para a garrafa de whisky que levava na mão direita, destapada, para as pernas cheias de marcas e pensei "quando terá esta desistido da vida?" mas sabendo tão bem que estava mesmo a perguntar "quando irei eu desistir da vida?"

6.24.2009

Eu, como todos, posso

dizer que gosto muito de uma pessoa que não me interessa, ser simpática para alguém de quem não gosto, calar-me quando tenho algo a dizer que me possa prejudicar, ser politicamente correcta para que isso me beneficie de alguma forma, mentir para subir na carreira, ser insistente para obter um resultado que me interessa, desligar-me de alguém que gosto porque a minha associação com ela não é vantajosa.
Eu posso roubar, mentir, matar, atropelar, bater, trair, prostituir-me, desde que não seja apanhada a fazê-lo.
Eu posso e em teoria poderíamos todos. A teoria do "melhores pessoas/piores pessoas" perde muito do seu valor intrínseco quando chegamos a adultos. Por isso, a menos que acreditemos num Deus castigador ou num Karma Cósmico, a única razão pela qual não fazemos é termos sido educados para a vida em sociedade. E isso, meus caros, nem todos fomos.

6.23.2009

Eu já li o João

e depois deixei de ler, não faço a mínima ideia porquê. Hoje voltei a ler e passou a um dos meus all time favorites (eu sou assim com os blogs, de paixões, irritações e desprezos, às vezes acho que dedico mais emoções aos blogs do que às pessoas que estão à minha volta).
Lembrei-me que sempre quis que o meu filho tivesse um nome biblico e não tem à conta do pai. Tem nome de estadista do Estado Novo. Às vezes até estas pequenas coisas são difíceis de (di)gerir.

Com os calores, os bronzeadores, os assadores, os Ronaldos, as Ronaldas e outras infantilidades ao serviço de mentecaptização progressiva dos indígenas, com o egoísmo feroz, com a solidão disfarçada em alegrias fugazes e anónimas da madrugada, esquecemos o essencial. No Evangelho de hoje, a palavra do Senhor recomenda que entremos pela porta estreita. "Entrai pela porta estreita", ou seja, não escolham o espaçoso do fácil e do imediato. "Eu sou o caminho", dirá através de João. É estreito, sim. Mas não há outro.

6.22.2009

Conclusões fúteis (II)

Eu (vocês não sei) funciono muito melhor quando não estou a ser eu.

Conclusões úteis

Ninguém [amigos incluídos] quer ouvir o que temos para dizer a menos que estejamos a dizer que sim a tudo e a dar razão a tudo o que ele/a acha.

Conclusões fúteis

Um blog impessoal é muito mais fácil de manter do que um pessoal.

6.20.2009

Da reprodução aos 5 anos

- Há células e na parede das células há uns baloiços. Então os cromossomas sentam-se e ficam a andar de baloiço, o cromossoma-namorado senta-se num lado, o cromossoma-namorada senta-se no outro lado. Depois aparece o cromossoma-bebé.

Puto, tens tanto a ensinar à mãe. Tanto.

6.18.2009

Parental control

agora eu queria escrever aqui um post sobre tusa à distância (ou ausência dela) e não posso.

lá terei de criar um blog anónimo como o outro, agora que já não há anonimato na bloga.

6.16.2009

Eu tenho

sono cansaço stress preocupações falta dores de cabeça olheiras enormes rugas cabelos brancos unhas por fazer cabelo por arranjar muitas coisas desarrumadas memórias da semana passada na praia jantares piscina comboio caminhadas cartadas conversas vidas a mudar começar acabar relações histórias telefonemas mensagens promessas numa igreja algum (pouco) alcool muitos cvs enviados falta de pachorra vontade de atirar tudo ao ar de vez.
Eu tenho muita coisa, mas sem dúvida que não tenho inspiração para escrever [e tenho pena].

6.09.2009

A minha filha é a maior*

foi hoje em visita de estudo à AR.
Primeira pergunta: "posso ir ao hemiciclo? Quero ver o Nuno Melo".
Segunda pergunta, ao passar por um deputado que estava a ser entrevistado para um canal de televisão "É o Nuno Melo?"
Terceira pergunta, sentada nas cadeiras do PS "Posso mudar para as cadeiras do CDS/PP? É que a minha melhor amiga está lá e são as do partido do Nuno Melo".

Tudo o que fiz foi dizer que o Nuno Melo era giro, ela até me viu a votar noutro partido.

*vantagens genéticas.

6.08.2009

A vida resolve-se por si só*

não sei se a vida se resolve. há coisas que se resolvem da maneira mais improvável: esperando.
ora nós não fomos geneticamente programados para esperar. ou, darwinisticamente, aqueles entre nós que foram geneticamente programados para esperar não sobreviveram através das décadas aos perigos, eram os que ficavam sentados à espera de descobrir que som era aquele e de repente viam a cabeça arrancada do corpo por uma derrocada (naqueles tempos - os das cavernas, em que a humanidade se foi definindo entre os que iriam sobreviver e os que nem por isso - havia muitas derrocadas, isso é do conhecimento geral). os nossos avós foram os que desataram a correr quando ouviam o barulho sem saber muito bem porquê e se safavam enquanto viam alguns palhaços placidamente sentados e com a cabeça arrancada. estes são os nossos genes, os que correm sem saber porquê ao mínimo som. é-nos impraticável esperar. é desesperante não poder agir. mas há mesmo coisas que só se resolvem com o tempo, com paciência.
a vida, por exemplo.

*copyright da princesa ou, se tiverem suficiente persistência, hão-de um dia ler um post meu sem estas anotações ridículas com a merdinha do asterisco.

No banho

M, 10 - se eu morresse o que é que tu fazias?
D, 5 - matava-me, ía para o pé do Terry Fox*.

*os filhos têm a mania do Terry Fox por causa das t-shirts que vêm cá parar, da Liga Portuguesa contra o Cancro.

Eu juro

que quero mesmo escrever. que se me esforçar consigo explicar como fui com as duas criancinhas ao Camões votar, como passeámos pelo jardim da estrela e algures ao longo desse caminho eu fui tão feliz o sol a bater naquela folha e que lindo e mais não sei quê. que vou ter umas mini férias a sério, no Algarve com amigos, seremos uns 8 ou 10, cartadas, copos, jantares, sol, mar, piscina, toalha, tenho a certeza que algures ao longo de algum caminho o sol será tão lindo a vida simples a bater numa folha e por esse momento eu serei feliz. mas não muito porque saberei que todos os dias à espera tenho o trabalho estupidificante que tenho sem direito a férias, mal pago e que detesto, porque sei que no caminho entre a estação de metro e o carro me desfaço em lágrimas (acontecimento estupidamente diário) porque eu sei que depois de correr para o pátio da escola dela, o trânsito da estrada de Benfica e o pátio da escola dele vai estar a minha casa. vazia.

6.05.2009

Voltei, porque sim

só para dizer que o meu mantra é o dos drogados e dos alcoolicos - só mais um dia - um dia de cada vez, todos os dias em repeat até a exaustão e chegar o dia seguinte - mais um dia.

E que, obviamente, esta coisa não tinha acabado pelas palavras de outra pessoa sobre as minhas, as quais, a quem de direito, o meu mui respeitoso idebosfoder agora e para sempre.

Não é por ter acabado isto que alguma coisa se tornou melhor - nem eu - infelizmente, diga-se de passagem.

pessoas com extremo bom gosto