11.29.2009

Pedro Mexia e a Cinemateca Portuguesa

Prólogo: Desculpa, querida Clara...

Pedro Mexia é uma das pessoas mais interessantes da geração dos trinta anos. É muito culto, polifacetado, muito inteligente, escreve muito bem, tem um humor sofisticadíssimo e um charme pessoal que lembra o de um cavalheiro inglês.

E consegue preservar-se. É raro o que diz ser posto em causa por quem quer que seja.

E é ainda director interino da Cinemateca, desde que João Bénard da Costa nos deixou.
Nessa qualidade escreveu o seguinte no website da Cinemateca, sobre a instituição que dirige:

"A Cinemateca deixou de ser um edifício administrativo com um cinema ao pé da porta. Agora é, toda ela, dos espaços subterrâneos aos espaços das cúpulas, um pórtico. Falta abrir a última das sete portas dele e continuar o percurso para o Museu com que sonhamos.
Quando esse Museu existir, o tempo da imagem e o espaço do imaginário confluirão no perpétuo movimento do começo e do retorno".


Creio que se trata de um overstatement literário de Pedro Mexia.

A Cinemateca é um espaço muito agradável e tem um acervo magnífico de filmes, mas é tudo menos um pórtico, na perspectiva do comum cinéfilo, que faça outras coisas além de gostar de cinema, como por exemplo trabalhar.

Não falo apenas de uma programação talvez desordenada e discutível, que isso é subjectivo. Falo de coisas simples, objectivas que qualquer um entende.

Depois de gabar a uma amiga o excelente "Unconquered", de Cecil B. de Mille, com Gary Cooper, descobri que passava na Cinemateca este Novembro. Feliz fiquei por poder partilhar com ela o filme.

Azar. Consulto o programa e passa às 15,30 no dia 4, quarta-feira.

Ela é banqueira de investimento, mas podia ser funcionária numa repartição, designer, whatever. Não dá para ir a essa hora. E o filme não repete.

"E que passa ao fim do dia? Se for às 19h já posso", diz-me ela.

Num horário mais acessível a todos deve haver um filme igualmente apelativo, pensei. Consulto o programa. Às 19h passa "El Crimen de la Pirindola", de 1965, Espanha. El Crimen de quê? Pode ser bom, penso com os meus botões, mas nunca ouvi falar. Até percebo de cinema, mas nunca tinha mesmo ouvido falar. Mas porque será que não puseram a Pirindola às 15,30 e o Unconquered às 19h?

Não desistamos. Descubro que no dia 6, pelas 21,30 passa o magnífico "Guess who's coming to dinner", de Stanley Kramer, e convido a minha amiga. A essa hora já dá. Perfeito. Vejo o horário da bilheteira.

A bilheteira funciona num horário limitadíssimo, entre as 14,30 e as 15,30 e as 18,00 e as 22.
E não se pode comprar bilhetes pela Internet. Incrível. Na época da Web 2.0, a Cinemateca ainda continua a vender bilhetes com os métodos usados aquando das estreias dos filmes que projecta.

Eu e a minha amiga trabalhamos perto do Marquês, mas não dá para ir comprar bilhetes às 14,30. Ela já está em frente aos monitores das cotações a essa hora. Combinamos um encontro às 19,30, junto à bilheteira. Compramos bilhetes e vamos picar qualquer coisa ao novo Luca, digo eu, meio satisfeito por lhe ter feito um sibilino convite para jantar. Jantar e filme. Um date completo.

Azar outra vez. Os bilhetes já tinham esgotado entre as 14,30 e as 15,30. E a Cinemateca está cheia de americanos que vivem em Lisboa. Pudera, com este filme... Filme que não repete. Não temos outra oportunidade para o ver.

Gostava tanto, mas tanto, que a enorme energia criativa de Pedro Mexia se pudesse também focar também nestas coisas , como direi, comezinhas. Bilheteira electrónica, horários mais acessíveis e repetição de filmes que se prevê poderem esgotar não é nenhuma coisa que se encontre no Faust de Goethe, mas é tão importante para as pessoas que utilizam instituições públicas como a Cinemateca....

(advertência final: os casos contados são imaginados a partir do estudo da programação de Novembro, mas tive experiências reais deste tipo mais de uma vez)

4 comments:

Clara said...

n tens que me pedir desculpa por nada...acho que ainda o pior de tudo é a programação, é quase impossível de consultar [já é assim há anos e anos].

Martim said...

Isso tb. Esqueci-me desse ponto. Os folhetos com a programação mensal não seguem a ordem cronológica.

CCF said...

Isso dá muito trabalho...e talvez dê pouco nas vistas. É a velha questão entre a escolha da cigarra ou da formiga.
~CC~

Anonymous said...

Os folhetos seguem a ordem cronológica, é preciso é saber consultá-los.
São dois, os folhetos. Um mais pequeno inserido dentro de um maior.
O mais pequeno segue a ordem cronológica.
O maior segue uma ordem temática.

pessoas com extremo bom gosto