12.28.2007

A E. veio da Sibéria

não sei há quanto tempo. É rechonchuda, muito loura e tem sempre um ar sorridente. A primeira vez que a vi foi há 5 anos, quando fui estagiar para Espanha e ela foi apressadamente contratada para limpar a minha casa. No meio do seu português arrussado explicou-nos que nessa altura, na terra dela estavam 40º negativos, o que era perfeitamente normal para aquela altura do ano.
A E. limpa agora a casa da minha mãe, da minha avó e a minha. Quando vai a casa a E. demora 3 dias inteiros para chegar, meio dia para a viagem de avião, o resto do tempo de comboio. Por isso a E. só vai a casa de 2 em 2 anos ou mais. A E. tem um filho do marido português, tem mais de 40 anos mas parece ter pouco mais de 30.
Hoje de manhã, ao lembrar-me dela tive um pensamento absurdo (eu não sou muito boa pessoa, para o caso de não terem reparado). Não me apetecia ir trabalhar e lembrei-me que se fosse a E. teria um emprego bem pior (raio de consolação) e ao mesmo tempo sei que pensei qualquer coisa como "mas pelo menos tem alguém que lhe ature as crises" (esquecendo-me providencialmente que eu quando era casada não tinha ninguém que me aturasse as crises e que pensava das minhas amigas solteiras coisas como "pelo menos é solteira", coisa que me parecia ser a compensação para todos os males).
Por isso dá para imaginar o choque quando a meio da manhã recebo uma mensagem da minha mãe a avisar que a E. hoje não viria. O marido morreu-lhe.

2 comments:

Otium said...

... que história... acontecem-me tantas dessas... :)

Margarida Atheling said...

Há vidas marcadas pelo drama... e, ainda assim, normalmente, essas pessoas recusam-se a baixar os braços. Também é verdade que não podem, não é?

Bjs

pessoas com extremo bom gosto